Uma segunda onda de impacto econômico
Nos artigos que escrevo para o site do escritório, é natural que eu me dirija para as empresas que atuam, de alguma maneira, no âmbito das licitações; entretanto, ao falar sobre a ata de registro de preços, a orientação acaba por alcançar também o interesse dos servidores públicos que também atuam nesse setor.
Isso porque chegamos a um momento específico da crise. Explica-se: assim como se fala em uma "segunda onda" de infecção, também estamos tendo reflexos inesperados em diversos setores da economia, como as consequências do aumento de algumas commodities, à exemplo do cobre.
Segundo o portal Valor Econômico, esse mineral teve um aumento significativo e o cobre, por sua vez, é é um dos minerais mais importantes para o setor da indústria; no caso específico do Brasil, nós temos uma situação agravante, já que há uma estreita relação entre as empresas brasileiras e as mineradoras no Chile que, por sua vez, perderam grande parte de seu faturamento, fecharam as portas e estão recebendo diversas demandas trabalhistas, elevando o preço do cobre à valores inimagináveis até pouco tempo (fonte: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/09/pandemia-ameaca-afetar-oferta-de-cobre-em-10-anos.ghtml)
O impacto no planejamento e no sistema de registro de preços
Tudo isso, de uma certa forma, interfere no contrato administrativo porque os valores passam aumentar significativamente demandando uma atenção, sobretudo, para as chamadas "atas de registro de preço" que é uma espécie de pré-contrato que visa padronizar e planejar as compras da Administração Pública durante um ano.
Por essa razão, me sinto seguro em dizer que este é o momento certo de revisar as atas de registro de preço, seja o licitante que tem atas vigentes durante esse período, seja própria administração para que esses contratos não causem problemas futuros, pois embora a Lei Geral preveja punições e penalidades para licitantes que não cumprem os seus contratos, ninguém, em sã consciência, quer precisar de um produto e não tê-lo, ao invés disso, enfrentar um longo processo de aplicação de penalidade que, eventualmente, pode ser até injusto dadas as circunstâncias atuais.
Por sua vez, o Decreto Federal n⁰ 7.892, que regulamenta o sistema de registro de preços, embora seja de 2013, traz consigo o aparato necessário para que se possa organizar e evitar esse tipo de problema: para administração, o art. 18 recomenda que esta chame os seus fornecedores para um eventual renegociação, visando ajustar a expectativa presente nos pré-contratos (atas) vigentes e a possibilidade real do comprimento dos empenhos quando estes forem emitidos.
Para os licitantes, porém, há uma recomendação um tanto quanto específica, pois no art.19, inciso I, o Decreto impõe que o fornecedor deve procurar a administração a fim de que se faça uma revisão dos preços ou o próprio cancelamento da ata em razão da não-possibilidade de cumprimento, mas o que chama atenção é que esse pedido deve ser feito antes da emissão do empenho, em palavras simples, antes de que a administração peça determinado produto em determinada quantidade ao fornecedor.
Isso acontece porque quando se emite o empenho e depois precisa se cancelar, por qualquer razão, o planejamento orçamentário da administração fica todo desorganizado de modo que chama atenção também dos órgãos de controle, à exemplo mais comum, o Tribunal de Contas.
Penalidades
Evidentemente não estou falando sobre uma punição "automática" ou "necessaria" do licitante que, eventualmente, deixou de verificar esse aumento antes da emissão do empenho, pois toda sanção deve ser precedida dos princípios do Direito Administrativo Sancionador, isto é, para aplicar uma penalidade há de se verificar o elemento subjetivo e também se aquele aumento poderia de alguma forma ter sido previsto em tempo hábil para que os valores da ata fossem renegociados - o que demanda uma análise caso a caso.
De toda forma, é tempo de revisar as atas de registro de preço, seja pelo licitante, seja pela Administração Pública, de modo que possamos evitar, ao menos, um pouco, os - mais que suficientes - problemas trazidos pela COVID-19.
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