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Pacote Anticrime e o Acordo na Lei de Improbidade: Aspectos Práticos

Atualizado: 4 de dez. de 2021

O tão discutido pacote anticrime enviado ao congresso pelo Ministro da Justiça, Sérgio Moro foi aprovado com severas alterações ao texto original. Em relação à Lei de Improbidade Administrativa, o artigo alterado foi o §1º do art. 17, veja como era antigamente:


Art. 17. [omissis]
§ 1º É vedada a transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata o caput.

O texto na versão anterior era péssimo: péssimo na ideia de não permitir nenhum tipo de acordo e péssimo porque a ação civil pública por improbidade administrativa se tornou, em muitos casos, uma mera ação de cobrança.


Imagem de Michal Jarmoluk por Pixabay


O bom acordo foi, é e sempre será melhor que qualquer sentença, por mais brilhante que seja. A justificativa de quem é contra acordo na LIA é que, na ação de improbidade, se discute interesse público que, por natureza, é indisponível. Veja o que dizia Maria Sylvia Zanella Di Pietro:


"A norma se justifica pela relevância do patrimônio público, seja econômico, seja moral, protegido pela ação de improbidade. Trata-se de aplicação do princípio da indisponibilidade do interesse público" (DI PIETRO, 2013)

Todavia e, com todo respeito, entender o princípio da indisponibilidade como "muro" à negociações entre o persecutório (MP ou órgão competente) e o Réu é só mais uma maneira burocrática de ler o Direito Administrativo.


O que o princípio da indisponibilidade me diz, nesse caso, é que, quando se trata de interesse público, o acordo deve ser permitido em lei dentro dos seus limites e possibilidades pois ela (a lei) é a fonte daquilo que entendemos como Interesse Público.


Por sua vez, o Ministro Sérgio Moro buscou alterar essa realidade apresentando o anteprojeto chamado "pacote anticrime" pelo que, no ponto que estamos discutindo, tinha o seguinte texto original:


"Art. 17. [omissis] § 1º A transação, acordo ou conciliação nas ações de que trata este artigo poderão ser celebradas por meio de acordo de colaboração ou de leniência, de termo de ajustamento de conduta ou de termo de cessação de conduta, com aplicação, no que couber, das regras previstas na Lei nº 12.850, de 2 de agosto de 2013, e na Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013.
" (NR)

Esse texto iria sacramentar o que vem sendo chamado pela doutrina especializada e pelos tribunais de "microssistema do direito anticorrupção" já que faz citações aos instrumentos já conhecidos por quem atua nessa área: "acordo de colaboração ou de leniência, de termo de ajustamento de conduta ou de termo de cessação de conduta", emanando a Lei das Organizações Criminosas e a Lei Anticorrupção (empresarial).


Vale salientar que poderia citar, inclusive, a Lei de Proteção à Concorrência, Lei Nº 12.529/11 que falou, pela primeira vez, do acordo de leniência. Entretanto, o Legislativo quis criar uma nova categoria de ajuste chamado "acordo de não persecução cível" que segue a categoria de "acordo de não persecução penal" adicionada ao CPP, como pode-se perceber:


“Art. 17. [omissis]
§ 1º As ações de que trata este artigo admitem a celebração de acordo de não persecução cível, nos termos desta Lei.
[...]
§ 10-A. Havendo a possibilidade de solução consensual, poderão as partes requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias.” (NR)

Isso não significa que o "acordo de não persecução cível" retira a LIA do âmbito do chamado Direito Anticorrupção, por sua vez, apenas adiciona mais um instrumento ao conjunto.

Ato contínuo, o que temos de esperar disso é o mesmo que tem acontecido, na prática, com os "acordos de colaboração ou de leniência, de termo de ajustamento de conduta ou termos de cessação de conduta", pois, no final das contas, muitas vezes, tudo é feito num ato só, junto ao Ministério Público, utilizando-se de todas as normas de uma vez (o que é muito questionado na doutrina especializada).


Nesse ponto é de se ressaltar que o Presidente da República vetou o art. 17-A que dava, aparentemente, exclusividade ao Ministério Público para fazer o chamado "acordo de não persecução cível", excluindo a Administração Pública lesada. Isso, de certa forma, me leva a compreender a razão de terem criado esse instrumento específico.


Eu, particularmente, gosto que tudo seja feito de uma só vez mas preferia que tudo também fosse integrado na lei e sem excluir a Administração, para se evitar confusão nos termos e na interpretação (o que gera abusos), portanto, eu preferia a legislação original.


Por último, vale salientar o §10-A (adicionado pelo Congresso Nacional) diz que "as partes [podem] requerer ao juiz a interrupção do prazo para a contestação, por prazo não superior a 90 (noventa) dias". Sinceramente, não vejo razão para que o prazo concedido não seja superior a 90 (noventa) dias e direi porque me posiciono contrário a essa interpretação.


O primeiro ponto é que não faz sentido que um acordo que esteja sendo costurado a mais de 90 (noventa) dias se perca porque a lei não permitiu um prazo maior. A lei poderia ser melhor escrita se dissesse: "prorrogável, se justificado".


Por outro lado, a Lei não fala em prazo "improrrogável", o que dá a entender, logicamente falando, que as partes não devem pedir um prazo indeterminado e que, quando definirem o prazo para costurar o acordo, num primeiro momento, não devem pensar em algo superior a 90 (noventa) dias, mas se passar disso, podem requerer a dilação do prazo, sem problema algum, ao meu ver.


Vale salientar que as partes podem fazer uso do negócio jurídico processual, previsto no Código de Processo Civil (vale lembrar que a LIA é procedimento especial cível) no artigo 191 e que não tem nenhuma implicação com o que foi legislado, veja-se:


Art. 191. De comum acordo, o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso.
§ 1º O calendário vincula as partes e o juiz, e os prazos nele previstos somente serão modificados em casos excepcionais, devidamente justificados.
§ 2º Dispensa-se a intimação das partes para a prática de ato processual ou a realização de audiência cujas datas tiverem sido designadas no calendário.

Assim, se as partes quiserem, podem definir o prazo para contestação a maior que 90 (noventa) dias para que possam negociar o acordo livremente, incluindo o não agendamento de audiências, etc.


Para concluir, considero um avanço, no fim das contas. Tem alterações desnecessárias e outras coisas mal redigidas mas já vai agilizar muitos casos que chegam a ter anos e anos de discussão ou atos de improbidade abafados por nulidades processuais e, por isso, a Administração Pública nunca verá seu dano ressarcido.


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